A tecnologia cerâmica passou a ser utilizada pelas populações pré-coloniais do litoral catarinense há cerca de 1.300 anos atrás, podendo ser encontrada nas camadas superficiais de alguns sambaquis e, também, em sítios que surgem por volta dessa data e que, embora se assemelhem aos sambaquis em diversos aspectos, apresentam menor quantidade de conchas e são mais rasos. Essa cerâmica é conhecida como pertencente à tradição itararé, caracterizando-se por recipientes pequenos de cor escura, geralmente mais altos do que largos, com paredes finas e pouca frequência de decoração que, quando ocorre, costuma ser principalmente ungulada, incisa ou ponteada. 

É importante dizer que não existe nenhuma informação sobre a existência de um povo “Itararé”. Esse rótulo foi criado por arqueólogos para identificar um tipo específico de cerâmica. Essa tradição cerâmica Itararé costuma ser associada aos povos Laklãnõ-Xokleng e Kaingáng, falantes de línguas Jê e que vivem no interior de Santa Catarina. Por esse motivo, os sítios litorâneos com presença desse tipo de cerâmica acabam também sendo associados pelos pesquisadores a populações Jê que, vindas do interior, teriam se estabelecido no litoral e trazido a cerâmica consigo.

Apesar desse entendimento geral, estudos mais recentes vêm indicando que esses sítios teriam, na verdade, sido formados por populações litorâneas. Nesse caso, em vez de serem resultantes da vinda de populações interioranas para o litoral, seriam decorrentes de transformações no modo de vida das populações litorâneas que deram origem aos sambaquis.

Ponta do Sambaqui

A porção litorânea que compreende a Ilha de Santa Catarina e arredores conta com a maior concentração de sítios com presença de cerâmica Itararé do litoral catarinense. Muitos desses sítios fazem parte do nosso dia-a-dia no município de Florianópolis, como o sítio Ponta do Lessa I, situado em ponta de mesmo nome, junto à Av. Beira-Mar Norte; o sítio Ponta do Sambaqui, situado no Parque Municipal Aníbal Nunes Pires, no bairro Sambaqui; e o sítio Ponta da Armação I, na ponta das Campanhas, praia da Armação do Sul.

Quer saber mais sobre os sítios com Cerâmica Itararé já registrados em Floripa? Na lista abaixo você pode conferir uma descrição de cada sítio. Informações sobre a localização, pesquisas, materiais encontrados, entre outras, podem ser verificadas no Mapa Interativo dos Sítios em Floripa.

Sítio conchífero com fragmentos de conchas em meio a sedimento escuro, sepultamentos, vestígios líticos, além de relato de presença de cerâmica Itararé-Taquara. A camada arqueológica é registrada a partir de 40cm de profundidade. Está localizado em frente ao terreno da loja de motocicletas Harley Davidson, responsável por impactar o sítio em 2012 com uma limpeza de restroescavadeira no local para construção de um estacionamento. Em 2015, a área do sítio foi perfurada, sendo injetado argila em profundidade, a pedido da construtura DJM, como parte dos estudos prévios para construção.

Consiste em um abrigo sob rochas localizado na Ilha do Arvoredo, onde Rodrigo Lavina encontrou e coletou vasilhames e fragmentos cerâmicos Itararé.

Sítio conchífero assentado sobre embasamento rochoso no local conhecido como Ponta do Vigia. É possível perceber pequenos perfis estratigráficos no fundo das casas, basicamente compostos por camadas de conchas. A equipe de Fossari (1987) encontrou fragmentos cerâmicos em superfície. Jockyman (2015) apresentou datas que sugerem pelos menos duas ocupações para esse sítio: uma entre 4700 e 4300 anos antes do presente e a mais recente em torno de 2600 anos Antes do Presente. O sítio tem sido destruído pela urbanização da área.

Sítio conchífero situado junto à praia da porção sul da ponta de Caiacanga-Mirim, numa faixa de areia que se estende por aproximadamente 500 m. Foi escavado por Rohr (1959), ocasião na qual foram revelados sepultamentos, material lítico, ósseo e cerâmico (Itararé/Taquara), restos faunísticos e estruturas de combustão. Naquela época, o sítio havia sofrido grande impacto devido à exploração do areal sobre o qual ele está assentado e à construção de prédios, estradas e outras estruturas. Atualmente, o número de construções existentes sobre a área do sítio é maior que na época da pesquisa, havendo inclusive um conjunto de 15 casas de oficias da Base sobre o local escavado por Rohr (1959), o que nos leva a pensar que ele se encontra ainda mais destruído. Nos fundos do conjunto de casas, contudo, é possível observar um solo mais escuro misturado a pequenos fragmentos de conchas, provavelmente vestígios remanescentes do sítio.

Sítio conchífero situado junto ao rio Alto Ribeirão, próximo de sua foz. Foi registrado por Rohr (1984) como localizado em terrenos de Candonga e, na época, já se encontrava parcialmente destruído pela construção de edificações, ocasião na qual apareceram diversos sepultamentos. Mais recentemente, o sítio foi alvo de uma pequena intervenção por Amaral e Scherer (2002), devido à abertura de uma fossa doméstica pelo atual proprietário, Sr. Wilson Lemos. Nessa ocasião foram coletados ossos humanos pertencentes a diversos indivíduos, um vasilhame cerâmico inteiro, material ósseo, material lítico e restos faunísticos.Em nossa visita ao local em 2014, não observamos material arqueológico em superfície, mas em conversa com o Sr. Wilson localizamos o ponto onde foi construída a fossa e, portanto, onde foi realizada a intervenção de Amaral e Scherer (2002). O Sr. Wilson também nos informou que hoje há cerca de 30 cm de aterro em seu terreno e que é possível que haja sítio também nos terrenos vizinhos, além de ter nos mostrado quais eram os antigos limites das terras de Candonga que, do trevo, estendiam-se por aproximadamente 140 m a leste.

Sambaqui do período mais tardio de ocupação do litoral catarinense, formado principalmente por ossos de fauna (marinha e terrestre) e sedimento escuro rico em matéria orgânica. Foi alvo de levantamento interventivo para delimitação em 2019, tendo sido também coletados dois testemunhos pela equipe do LEIA e MArquE (UFSC). Apresenta artefatos líticos e ósseos, material faunístico composto por animais marinhos e terrestres, cerâmica Itararé e sepultamentos humanos. Foi registrado por Rohr (1969), o qual coletou um crânio na ocasião de sua visita ao local. Posteriormente, a equipe de Fossari (1988a) também visitou o sítio, e coletou mais um crânio que estava aflorado em superfície. Narram os pescadores que nos tempos da construção do galpão da marinha que há no local, foram destruídos mais de 20 esqueletos humanos.

O sítio situa-se junto ao morro do Santinho, no extremo leste da praia dos Ingleses. Foram coletados restos faunísticos, lascas de diabásio e vários fragmentos de cerâmica Taquara/Itararé. As evidencias arqueológicas mostram que outrora foi um local de acampamento de grupos Jê.

Sítio conchífero situado sobre o morro do Rapa, no costão leste da praia da Lagoinha de Ponta das Canas, que apresenta cerâmica Itararé. É possível observar conchas aflorando em superfície na trilha que passa pelo costão, evidências que continuam aparecendo no terreno da Pousada da Vigia, subindo morro acima até a estrada que passa pelo alto do morro.

Trata-se de um sítio conchífero onde foram evidenciados vestígios líticos lascados (em diabásio e quartzo), restos faunísticos (vértebras de peixes), fragmentos de remanescentes ósseos humanos (incluindo ossos longos) e fragmentos de cerâmica Itararé em área que apresenta sedimento arenoso de coloração escura. Localizado no sudoeste da Ilha das Campanhas.

 

Sambaqui situado à beira-mar, na encosta do morro que forma a ponta norte da praia de Ponta das Canas. Apresenta perfis expostos pela ação da maré, nos quais é possível observar material arqueológico faunístico, lítico e cerâmico. As evidências arqueológicas continuam morro acima. Concreções do sítio aparecem ao longo da faixa de areia em frente ao perfil exposto, possivelmente oriundas de seu desbarrancamento. Em 2019, a equipe do LEIA (UFSC) realizou levantamento interventivo no local para delimitação do sítio.

Trata-se de um sítio a céu aberto, localizado sobre a Ponta do Caçador, onde foram evidenciados vestígios sobre a superfície: líticos lascados em quartzo, diabásio e granito; plaquetas de diabásio; um percutor fraturado; além de sedimento de coloração escura – diferente do solo circundante. Fragmentos de cerâmica Itararé também já foram encontrados nesses sítio.

Sítio conchífero assentado em parte sobre o cristalino e em parte sobre o sedimento que forma a ponta do Lessa, na baía norte. Apresenta perfis expostos pela ação da maré e pela escavação empreendida por Beck na década de 1960 (Beck et al 1969, Beck 2007), a qual revelou artefatos líticos e ósseos, material cerâmico, restos faunísticos e ossos humanos dispersos, sendo possível identificar somente um sepultamento. Nos perfis expostos, observamos que o sítio é formado por matriz de sedimento escuro misturada com conchas, principalmente Anomalocardia brasiliana. Observamos também fragmentos cerâmicos Itararé e lascas de granito e diabásio. Segundo Rohr (1984), este sítio já estaria parcialmente destruído para a fabricação de cal em 1969.

Sítio conchífero situado parte sobre o embasamento cristalino e parte sobre o sedimento que forma a ponta do Sambaqui, na baía norte. Em sua porção leste apresenta perfis expostos pela ação da maré, nos quais observamos material malacológico, ossos de peixe, fragmentos cerâmicos Itararé, fragmentos e lascas de quartzo, granito e diabásio. Foi possível constatar que, pelo menos em sua porção leste, o sítio está assentado diretamente sobre o granito que forma a ponta, sendo caracterizado, em sua base, por um pacote de 30 a 40 cm de conchas – principalmente Ostrea sp, Anomalocardia brasiliana e Lucina pectinata. Sobre a camada conchífera há um pacote de 50 a 60 cm de sedimento sem conchas. O chão em frente aos perfis está repleto de material arqueológico que desbarrancou com a erosão contínua do sítio, local onde encontramos uma lâmina de machado polida em diabásio que foi coletada e levada ao LEIA (UFSC). Em sua visita ao sítio, Fossari (1988b) coletou fragmentos cerâmicos e amostras conchíferas.

Está registrado no CNSA como “sambaqui”, porém Rohr, o autor do registro, refere-se a ele como “raso de sepultamentos” na bibliografia consultada, e Fossari encontrou nele fragmentos de cerâmica, referindo-se a ele como sítio pré-colonial Jê. Consta como “sambaqui” no CNSA quando, na verdade, trata-se de assentamento conchífero com cerâmica Itararé. Além dos fragmentos de cerâmica mencionados, foram coletados ossos de mamíferos pela equipe de Fossari.

Sítio conchífero com cerâmica Itararé situado sobre dunas, na praia de Jurerê, próximo ao hoje soterrado rio do Meio. Foi evidenciado por obras de terraplanagem que o destruíram em 75%, sendo seu material utilizado para aterrar o rio do Meio. As máquinas revelaram um pacote arqueológico composto de restos faunísticos (mamíferos, peixes e moluscos), fragmentos cerâmicos e líticos misturados com cinza e areia (Fossari 1987). Posteriormente, o sítio foi alvo de uma escavação de salvamento pela equipe do Museu Universitário, devido à construção de uma passarela do empreendimento imobiliário Jurerê Internacional (Fossari 2004). Em nossa visita ao local não foi possível observar qualquer vestígio arqueológico, uma vez que o sítio foi esgotado na escavação.

Sítio conchífero com cerâmica Itararé localizado no extremo sudeste da praia de Santo Antônio. Foi registrado pela pesquisadora Teresa Fossari na década de 1980. No local, além de fragmentos de conchas, foram identificados fragmentos de cerâmica Itararé-Taquara. Atualmente o local é ocupado por barracas de pescadores.​

Sítio conchífero com cerâmica Itararé situado na porção noroeste da praia da Tapera, sendo limitado pela foz do rio da Êra. Foi escavado por Rohr (1959), ocasião na qual foram revelados muitos sepultamentos, material lítico, ósseo e cerâmico, restos faunísticos e estruturas de combustão. Em sua visita ao local, Fossari (1988a) não conseguiu observar material arqueológico em superfície, uma vez que a área escavada por Rohr já estava parcialmente ocupada por casas residenciais ou coberta por vegetação, porém observou vestígios do sítio em um perfil que margeava o rio da Êra. Segundo essa pesquisadora, é possível que Rohr tenha esgotado o sítio em sua escavação. Em nossa visita ao local tivemos dificuldade em obter autorização para caminhar sobre a área do sítio que permanece desocupada, mas até onde nos foi possível adentrar o terreno, não observamos qualquer material arqueológico em superfície.